Sobre o Evento
Um congresso que superou todos os desafios impostos e conseguiu manter e valorizar a diversidade e a unidade que marcam tanto a área como o campo da Saúde Coletiva. Realizada na tarde de 26 de novembro, a cerimônia de encerramento do 11º Congresso Brasileiro de Epidemiologia – EPI 2021 celebrou o esforço coletivo e sinalizou a necessidade de ação conjunta e crítica para a superação da pandemia.
Dos 3.583 inscritos, 2.794 credenciaram-se e estiveram presentes nos 5 dias do evento. Do total de inscritos, 20% são estudantes de graduação, cerca de 40% estudantes da pós-graduação, e demais profissionais e docentes. Da parte científica, foram submetidos, ao total, 4.419 trabalhos. Desse montante, 360 resumos foram aprovados para as sessões de Comunicação Oral Coordenada, sendo 340 efetivamente apresentados. Já na modalidade pôster eletrônico foram aprovados 3.470 trabalhos e, apresentados, 2.823.
Três moções foram submetidas às comissões do evento. A Moção em defesa da qualidade e disponibilidade das bases de dados de interesse para a saúde, destacando a necessidade de dados sobre as populações negra e indígena. Moção em defesa do Sistema Nacional de Pós-Graduação Brasileiro, no qual é denunciado o quadro de desmonte da Capes e asfixia do seu processo de avaliação. Por fim, Moção de apoio à realização do Censo Demográfico.
Muitas pessoas tornaram possível a realização de um congresso que, por conta da pandemia, levou quase 2 anos de organização: cerca de 60 voluntários nas sessões de comunicação coordenada e os mais de 30 profissionais reunidos no backstage, integrantes das empresas Método Eventos Científico, responsável pela Secretaria Científica, e Widecam, responsável pelo ambiente virtual , trabalhadores da equipe de TI da Fiocruz e da ENSP e funcionários da Secretaria Executiva, além da parceria com as Comissões do evento e apoio da diretoria da Associação.
Moção em defesa do Sistema Nacional de Pós-Graduação Brasileiro
A Epidemiologia Brasileira expressa sua profunda preocupação com as incertezas produzidas pela suspensão judicial da Avaliação Quadrienal (2017-2020) e pelos sistemáticos ataques ao Sistema Nacional de Pós-Graduação Brasileiro. A avaliação dos Programas de Pós-graduação é evento histórico e realizada por pares, sendo referência nacional e internacional por sua capacidade de indução de processos do ensino da pesquisa.
Pautado por um modelo referenciado por comparação e cuja parametrização tem sido constantemente discutida e aprimorada pela comunidade científica, a avaliação foi alvo de um profundo escrutínio do campo da Saúde Coletiva por meio de profundo diálogo no interior do Fórum de Coordenadores da Pós-Graduação em Saúde Coletiva da ABRASCO e com a incansável participação dos Coordenadores da área na CAPES. É imprescindível constar que o último ano do período avaliativo foi atravessado pela Pandemia de COVID-19 e, sobretudo, pela indiscutível dedicação do nosso Campo na produção de conhecimento que pudesse contribuir para a vida e para as diferentes formas de exposição e sofrimento que os povos estiveram expostos nesse período.
Em contrapartida, o que temos observado atônitos é a baixa transparência da Presidência da CAPES quanto aos esforços empreendidos para defender a Avaliação Quadrienal e, sobretudo, o Sistema Nacional de Pós-Graduação. Soma-se a isso as incontáveis decisões monocráticas da Presidência da CAPES, como o anúncio de um calendário de apresentação de propostas de cursos novos para o Sistema mesmo frente aos questionamentos judiciais do processo avaliativo, a divulgação de mudanças nos processos que envolvem operacionalmente a avaliação, inclusive a classificação de periódicos das áreas, a ausência do Plano Nacional de Pós-Graduação 2021-2030, entre outros muitos exemplos da história recente da Instituição. Tal cenário se agrava ainda mais pela possibilidade cada vez mais concreta de novas eleições para coordenadores das áreas da CAPES sem a conclusão do processo avaliativo, aspecto que coloca em risco a consistência do árduo trabalho de companheiras e companheiros da Pós-Graduação nos últimos cinco anos.
Nesse sentido, a Plenária do 11º Congresso Brasileiro de Epidemiologia aprova essa Moção e clama pela: 1) retomada imediata da Avaliação Quadrienal, 2) transparência e coletivização dos processos decisórios que envolvem a CAPES junto ao Conselho Técnico-Científico da Educação Superior, 3) prorrogação dos mandatos do Coordenadores de Área até a conclusão do período avaliativo e 4) urgente construção do Plano Nacional de Pós-Graduação 2021-2030.
Moção em defesa da qualidade e disponibilidade das bases de dados de interesse para a saúde
No Brasil, o Ministério da Saúde, DataSUS, Secretarias Estaduais e Municipais de Saúde e outras instituições mantêm diversos sistemas de informação em saúde que são de suma importância para pesquisas e análises que fornecem subsídios para as políticas de saúde no país. Esta moção reafirma a importância da experiência e o envolvimento da comunidade de Saúde Coletiva na manutenção, desenvolvimento e análise dessas bases de dados, considerando inaceitável qualquer retrocesso no acesso e transparência aos dados.
Nesse espírito, e considerando a tradição e experiência do Brasil na gestão e disseminação de dados de interesse para a saúde e considerando a necessidade de ampliar e qualificar os dados de forma a permitir a oportuna e necessária intervenção sanitária, são colocadas as seguintes propostas, aprovadas em plenária final do 11º Congresso Brasileiro de Epidemiologia, realizado de 22 a 26 de novembro de 2021:
- Os sistemas de informações em saúde devem permitir o acesso livre e transparente para toda comunidade de Saúde Coletiva, contribuindo assim para o desenvolvimento de políticas de saúde.
- A disponibilização dos dados gerados por esses sistemas de informações, deve ser oportuna, permitindo análises de situação em tempo hábil para ação. Para isso é necessário regularidade na divulgação, com a periodicidade apropriada para cada base. Atrasos na divulgação (apagão de dados) são, por princípio, inaceitáveis.
- Reafirma-se a necessidade de transparência, com acesso a microdados anonimizados, preferivelmente com chaves anonimizadas identificadoras dos pacientes, de forma a relacionar as diferentes bases de dados e permitir o acompanhamento ao longo do tempo. Neste sentido, deve-se avançar na estruturação da Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS), mantendo diálogo permanente entre os vários entes que disponibilizam e fazem acesso regular aos dados. Também é importante manter o canal Sistema Eletrônico de Informações ao Cidadão (e-SIC) da CGU para eventuais requisições.
- É necessário realizar consultas regulares, de caráter técnico, com a comunidade de produtores e usuários para melhor padronização das bases, com rotinas para melhoria da qualidade dos dados (limpeza, eliminação de duplicidades etc.). Eventuais alterações nas bases de dados devem ser discutidas em fóruns e testes devem ser programados, de forma a minimizar riscos de inacessibilidade.
- Deve-se estabelecer mecanismos transparentes de interlocução entre as diversas secretarias do Ministério da Saúde, DATASUS, Secretarias estaduais e municipais de saúde e academia, outras instituições públicas como IBGE, INPE, gestores de programas de auxílio governamentais, setor de transportes com bases de dados de mobilidade, de forma a estimular mecanismos colaborativos, testar mudanças dos sistemas quando necessário e compartilhar ferramentas desenvolvidas, criando um ambiente de co-produção na análise de dados.
A tradição brasileira de construção de sistemas de informação em saúde é essencial para todas as ações de saúde pública devendo ser preservada, ampliada e atualizada, trazendo as inovações que ampliem seu uso para o bem da população brasileira.
Moção de apoio à realização do Censo Demográfico
O Censo demográfico, realizado a cada dez anos, é a base do desenvolvimento nacional e o principal recurso para obtermos um retrato da população brasileira. Trata-se da mais completa investigação sobre a estrutura e dinâmica populacionais de um país, principalmente em nível municipal, e é o principal instrumento para a formulação de políticas públicas nas áreas da saúde, educação e situação das desigualdades no país.
A previsão do último Censo era ocorrer em 2020. Desde 2019, no entanto, há um intenso debate de dimensões técnicas e políticas que culminaram em idas e vindas a respeito de cortes de orçamento, e em uma redução dos instrumentos de coleta de dados. A estas questões somou-se a crise sanitária provocada pela Covid-19, que restringiu a circulação de pessoas, impedindo as idas a campo. Todos estes fatores impediram os procedimentos de testes de campo e coleta de dados em 2020, e o problema se arrastou ao longo de 2021. Após intervenção do Supremo Tribunal Federal para garantir a realização do Censo, e com viabilidade orçamentária, a previsão do início de coleta é em junho de 2022. Contudo, os questionários foram reduzidos para 26 perguntas no questionário básico e 77 para o questionário da amostra. Em 2010 estes questionários possuíram, respectivamente, 34 e 102 questões.
A retirada de perguntas traz enorme preocupação a respeito da descontinuidade da série histórica. Ainda que haja outras fontes de dados para a sua obtenção, a forma de coleta não se dá necessariamente através dos mesmos quesitos, como o que ocorre para obter informações sobre migração internacional, para a qual o IBGE propõe o uso de dados do Ministério da Justiça e Segurança Pública. Além disso, nem sempre as fontes alternativas possuem plano amostral compatível com a análise em nível individual. O exemplo mais evidente disso é o uso de informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), cujo aplano amostral só permite a obtenção de informações para o nível de microrregiões. Vale mencionar que uma quantidade irrisória de municípios tem tamanho suficientemente grande para representar uma unidade amostral. A vasta maioria dos municípios brasileiros depende, portanto, diretamente das informações censitárias para realizar o planejamento adequado, o monitoramento e a avaliação de políticas públicas.
Há, ainda, uma grande preocupação sobre a condução da coleta de dados do Censo Demográfico nos territórios. O ano de 2022 será um ano eleitoral. É preciso constante monitoramento para que a máquina institucional aplicada para esta finalidade seja utilizada unicamente para garantir o levantamento oportuno de dados. O Censo deve garantir a soberania nacional pelo conhecimento da realidade dos diversos locais do país, e não pode ser utilizado como estratégia de capilarização de propaganda política. Além disso, a ida a campo requer cuidados adicionais com as equipes, no sentido de não promover a transmissão comunitária da Covid-19 no país, ainda considerada preocupante pelos especialistas. A provisão de equipamentos de proteção individual, na fase atual, ainda deve ser vista como prioritária, principalmente em locais com população mais isolada, ou em bolsões de vulnerabilidade social e privações sociais e econômicas.
Diante dos desafios à sua realização e às mutilações dos questionários a serem utilizados, a Associação Brasileira de Saúde Coletiva apresenta esta moção em defesa da realização do Censo, aprovada na plenária final do 11º Congresso Brasileiro de Epidemiologia, realizado de 22 a 26 de novembro de 2021. Pretendemos que este posicionamento some forças às diversas organizações governamentais, associações acadêmicas, institutos de pesquisa e a sociedade civil, para garantir apoio ao IBGE enquanto produtor de estatísticas públicas.